sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

O Paradoxo Claptoniano


Eric Clapton é um dos grandes azarados do rock. Por ser um dos maiores nomes do rock, esse azar fica proporcionalmente potencializado. Clapton nunca foi um sucesso real de vendas, não a nível do que merecia, como os Stones ou George Harrison, e a crítica sempre o tratou ou como alguém que só se fazia excelente na companhia de outros, ou com total indiferença.

Essa divergência entre seu valor genuíno e a falta de reconhecimento à altura pode muito bem se enquadrar no jargão acadêmico mais batido: Clapton é um paradoxo. Fez parte de uma das mais influentes bandas de todos os tempos, o Cream, mas que, desafortunadamente, e sabe-se lá por qual motivo, nunca foi aceito no cânone das bandas do British Invasion que viraram de ponta cabeça o mercado fonográfico norte-americano na década de 60. E, como primeira insurgência da sina de acesso pelas portas dos fundos de Clapton, a imprensa o cultuava como um deus da guitarra mas levantava sérias suspeitas se sua proficiência se manteria longe do talento dos parceiros Ginger Baker e Jack Bruce. E Clapton sempre se pressionava a provar para todos e a si mesmo que era um nome representativo e independente, o que o motivou a fundar, após o fim do Cream em 1969, outras duas das maiores (e mais efêmeras) bandas da história da música: a magnífica parceria com Steve Winwood no Bilnd Faith (que rendeu uma das mais comoventes canções, Can´t Find My Way Home), e a emblemática e monumental Derek and The Dominos.

O Blind Faith era um experimento pioneiro na área dos supergrupos (fundados por estrelas já consagradas que tinham o objetivo de fazer gracinhas de virtuoses), daí que não durou mais que o fôlego projetado de vida em um só álbum. Mas o Derek and The Dominos foi um caso sintomático e curioso à parte. Enquanto outros fenômenos musicais da época faziam questão de se mostrarem como dissolutos primatas do sexo, Clapton provou mais uma vez o seu karma de azarado em se apaixonar, romanticamente, pela mulher de George Harrison, Patti Harrison. Até aí tudo bem, mas acontece que ele inventou de fazer uma grande declaração de amor velada criando um outro grupo em que não se identificava como Clapton, mas com o pseudônimo de Derek. Claro que haviam as fotos e a referência ao verdadeiro artista no interior do álbum, mas esse mascaramento impediu que a maior parte do público soubesse de quem se tratava e o disco resultou em um enorme fracasso de vendas e em uma indiferença quase total por parte da crítica. Mesmo assim, para ampliar o paradoxo claptoniano, o álbum Layla and Other Assorted Love Songs é um (me desculpem de novo, mas fazer o quê?) dos dez melhores álbuns de todos os tempos, com uma série de músicas excepcionais, como Bell Botom Blues, Tell the Truth, Layla, Keep on Growing, sendo um mix de composições sólidas, com releituras bombásitcas (como Little Wing, homenagem a Hendrix, que morrera duas semanas antes da gravação), e jams monumentais, como Key to The Highway, tocadas com a leveza suprema do encontro descompromissado entre gênios (desculpem, novamente, a babação, mas é que é a pura verdade!). Mas o paradoxo apontou suas mãozinhas mais uma vez na vida de nosso herói Eric Clapton, pois logo após o lançamento do disco e o começo da turnê de shows, Duane Allman, o célebre primeiro guitarrista da The Allman Brothers Band, convidado de Clapton para compor os The Dominos, morre em um acidente de moto. (Cerca de dez anos depois, o baterista do The Dominos, Jim Gordon, como se não bastasse, sofre um surto psicótico e mata a própria mãe.)

Como disse, esse disco teve vendas pífias, e nenhuma atenção da crítica _ o que foi um dos maiores crimes e burrices da Universal, que não o divulgou_, lançando Clapton numa paranóia depressiva e no vício em cocaína que, praticamente, o levou ao ostracismo na década de 1970. Um detalhe ainda: antes do Derek, Clapton saiu em turnê com a dupla californiana Delaney & Bonnie, resultando em outro marco do paradoxo, esse fantástico albúm aí embaixo:


Um dos (mais uma vez, atenção! Preparados?) melhores álbuns ao vivo de todos os tempos, mas com um adendo inconveniente: o áudio deixa muito a desejar.

Clapton perderia um filho de forma trágica, purgaria um inferno para se livrar das drogas, mas retornaria no final da década de 80 e por toda a década de 90 com uma revigorada coleção de ótimos discos, como Jorneyman, Unpluged, From the Cradle, e uma série de acompanhamentos históricos como Riding with the King, com B.B. King. O público e a crítica já tinham feito a mea culpa quanto ao Derek and The Dominos, alçando-o ao cânone e nas listas de vendas. Pode-se dizer que a maturidade foi muito boa para Clapton, mas não o processo de maturação.

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